A crítica de cinema esbarra num duplo obstáculo: é preciso evitar simplesmente descrever os filmes, mas também aplicar-lhes conceitos vindos de fora. A tarefa da crítica é formar conceitos, que evidentemente não estão "dados" no filme, e que, no entanto, só convêm ao cinema, e a tal gênero de filmes, a tal ou qual filme. Conceitos próprios ao cinema, mas que só podem ser elaborados filosoficamente. Não são noções técnicas (travelling, raccords, falsos raccords, profundidade de plano, planeza, etc.), mas a técnica não é nada se não serve a fins que ela supõe e que ela não explica. (DELEUZE, 1992, 75)
Esse espaço se inicia com a perspectiva de um fazer diferente. Como nos chama atenção a citação acima, a crítica de um filme (e também de outras áreas artísticas), em geral, ora se resume a uma descrição de um filme ora à aplicação de idéias/teorias vindas de fora matando a sua potência artística – visto essa doença aguda da interpretose que nos assola. Tentação que alguns psicanalistas custam a ceder e que se prestam a tudo interpretar. O filme A árvore da vida é um prato cheio para eles principalmente em função dos conflitos familiares presentes (pai-mae-filho).
Se permitir experienciar um filme. Se arriscar a compor com ele e desviar para diferentes caminhos construindo diferentes sentidos. Talvez essa possibilidade de relação entre a cultura e a experiência possa ser bem interessante e é o que se pretende arriscar com esse espaço (Cultura e Experiencia).
O filme de Malick coloca como pano de fundo a problemática da existência, do sentido da vida de maneira um tanto ideológica. Ao fazer alusão do macro ao microcosmos utiliza-se de imagens e músicas eloqüentes desvalorizando o universo cotidiano, da micropolítica cotidiana na busca de um sentido único para a existência: Deus.
Vida e morte. Sucesso e fracasso. Natureza e graça. A figura da árvore chega a ser emblemática. Lógica binária, dialética, duas faces da mesma moeda. Mas a vida é mais, a vida é múltipla. Será que se trata de buscar um sentido único ou criar múltiplos sentidos?! Talvez à A Árvore da vida caberia melhor O rizoma da vida.
Rafael, meus parabéns. Adoro a ideia deste seu 'fazer diferente'. Acho que com relação à arte, algumas vezes, nos falta a contemplação, creio piamente que ela vem primeiro, antes de qualquer coisa. Talvez o preparo do público para um olhar mais aberto à recepção desta arte (literatura, cinema, música, pintura etc) se faça necessário. Por isso que sou entusiasta de ações ligadas à formação de platéias. Não sei se é bem isso que você está querendo fazer, mas me alegra este diferencial do Cult. Simplesmente noticiar é o óbvio. Emocionar, provocar, atiçar o questionamento crítico ou a reflexão é muito mais interessante e produtivo.
Fazer uma crítica bacana é bom, mas pode não ser interessante para quem é público. Levando pra literatura, que é minha praia, a crítica me interessa enquanto escritora porque me sinto perdida sem feedback crítico, no entanto esse outro olhar, o do leitor-público, é mais pessoal e delicado, mais belo, com certeza. E a arte é recebido por cada um de uma forma tão peculiar que não deveria ser desprezada.
O texto poderia ser maior?
Boa, tentei ver esse filme ontem mas não rolou. Agora fiquei interessado... aliás, assisti o "Melancolia" do Lars Von Trier, ninguém vai comentá-lo?
Vi Melancolia ontem, ainda estou digerindo! Lars von Trier cutuca né, mete o dedo na ferida onde ninguém quer ver, ele vai lá e escancara. Rá, tinha um cara na poltrona ao lado que dava gargalhadas nos momentos mais impróprios, às vezes tecia uns comentários no meio do filme. Pra sala de cinema sou conservadora, mesmo: seja discreto e respeite o momento de disfrute alheio!
Ainda não vi... estou ansioso para assitir Melancolia... ansioso para a melancolia... hehehe. Ao que parece há várias possibilidades de atravessamentos entre os dois filmes (A árvore da vida e Melancolia). Vamo ve como vai descer o filme e o que ele me mobilizará... De repente sai algumas coisas e posto aqui!
PS: onde ta passando Thaiza?
Vi ontem o "Árvore". Mesmo reconhecendo o límite da técnica, ela merce destaque. Achei estrondoso, tanto nas imagens pré-históricas, cósmicas e míticas, e muito mais na genial estética do rotineiro, entre sons e cortes (família). Mas ao contrário de alguns críticos (por exemplo, Roger Ebert) que se "viu" no filme e conseguiu sentir uma forte conexão com a história, só consegui apreciá-lo a distância. A barreira cultural do retrato familiar, ao contrário do mítico, é muito forte e creio, servirá muito mais para um público (Americano ou não) que se veja retratado naquela narrativa.
Cada vez que leio seus comentários me desespero por não conseguir tempo pro cinema (adulto, frise-se!). Vou tentar assistir os dois nesse fim de semana. Duas pauladas de uma vez. Adoro essas trocas de figurinhas! A gente tem que movimentar mais isso por aqui, por isso penso que o Cult realmente esteja mudando, há uma nova demanda. A formação de público é importante. Eu acho... Beijo aê!